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27 de outubro de 2023
[327] – Dupla do Barulho
A economia verde engendrará rápidas melhoras nos padrões de vida, desde que medidos nas múltiplas dimensões do bem-estar.

Sobre qualquer sério conflito, ou controvérsia, são sempre destacadas três posições: as duas favoráveis aos extremos e a que buscaria algum “caminho do meio”, sarcasticamente assimilado à imagem dos que ficam “em cima do muro”.

Porém, diante de qualquer proposta para o futuro, é muito mais adequada a ideia de que tal trevo tenha, ao menos, quatro folhas. Entre a firme rejeição ou a aceitação entusiástica de uma proposição, sempre brotam as que – a contragosto ou de forma cautelosa e crítica – tendem a admiti-la ou a repeli-la.

Na tipologia política, seriam os moderados centro-esquerda e centro-direita. Mas com similares em muitas outras polêmicas. Em especial, sobre a economia do desenvolvimento sustentável, que incautos adoram chamar de “economia verde”.

Impõe-se, aqui, uma rápida digressão. Verde é cor absolutamente indesejável aos oceanos, que são 70% da biosfera e constituem o maior estoque de carbono. Por isto, é turquesa (ou ciano) a cor do desenvolvimento sustentável e de sua economia.

Embora tal batalha simbólica já esteja perdida, o problema merece registro antes da retomada do fio da meada sobre a tipologia que apresenta os economistas divididos em quadrantes, em vez de na famigerada trindade.

Os mais radicais sobre as restrições ecossistêmicas – que se intitulam “ecológicos” -, propõem uma “prosperidade sem crescimento”, que prepare o futuro “decrescimento”.

Na outra ponta, estão os que confiam na superação dos problemas ambientais pelo uso dos mesmíssimos trunfos que geraram a prosperidade das mais avançadas nações democráticas do hemisfério norte.

O mais frequente é que apontem três: o declínio da fertilidade humana, o investimento em educação e capital humano e o aumento no poder da inovação. Mas, entre estes panglossianos, também surge um coringa: a qualidade das instituições.

No “caminho do meio”, não há somente “ecológicos ma non tropo”, como Jeffrey Sachs ou Sir Partha Dasgupta. Também há confiantes que não se misturam aos panglossianos. Por exemplo, Carlota Perez, Mariana Mazzucato ou Giovanni Dosi.

Foi este último quadrante o que recebeu reforço de peso com a defesa de uma ousada tese: prioridade a firme combate ao aquecimento global aumentará o crescimento econômico.

Não é outra a ideia que acaba de ser frontalmente contraposta à “sabedoria convencional” por uma dupla do barulho: Sir Nicholas Stern e Joseph Stiglitz (Nobel em 2001). Em artigo publicado pela revista Industrial and Corporate Change (32, 277–303).

Acham que a “transição verde” ocorre num momento em que os custos de oportunidade macroeconômicos de fortes ações climáticas poderão ser especialmente baixos e os benefícios particularmente altos. Tanto devido a deficiências persistentes da demanda agregada, quanto a avanços tecnológicos, como inteligência artificial e a robotização.

Num mundo com tantas travas de mercado, há ineficiências profundas e generalizadas. A economia global não está na sua fronteira produtiva (nem em sentido estático, nem dinâmico). Então, acham possível garantir que a melhor proposta sejam intensas ações de descarbonização, com base em oito razões.

Em primeiro lugar, o crescimento aumenta quando se empreende projetos de maior retorno, mesmo que de maior risco. Em segundo lugar, uma ação climática mais forte reduz as despesas improdutivas necessárias à substituição de ativos destruídos por fenômenos climáticos, assim como as despesas defensivas necessárias à proteção contra tal destruição.

Terceiro, as mudanças nos sistemas de inovação que integrem uma estratégia de combate ao aquecimento global são, elas próprias, promotoras do crescimento. Ainda mais à medida em que se tira partido das economias de escala e dos inerentes benefícios da aprendizagem.

Em quarto lugar, a relevância das alterações climáticas tem efeitos de economia política, permitindo resolver certas falhas do mercado (como as associadas a imperfeições nos mercados de capitais).

Quinto, a importância das alterações climáticas pode ter outros efeitos comportamentais, que se traduzem em crescimento mais forte. Obrigam a se pensar a longo prazo, quando um dos impedimentos é justamente a miopia dos participantes.

Em sexto lugar, especialmente numa era marcada por uma procura agregada deficiente, uma ação climática mais forte conduzirá uma plena utilização dos recursos da economia.

Sétimo, uma ação climática mais forte estará associada a uma melhor saúde – e isto também aumentará o crescimento da produtividade. E, em oitavo lugar, ressaltam que as alterações climáticas prejudicam a biodiversidade, da qual dependemos de múltiplas maneiras.

Concluindo, declaram-se otimistas de que aumentará o crescimento, ao menos a curto e médio prazo – crescimento medido em relação ao contexto contrafactual relevante: o crescimento com a atual insuficiente ação climática.

Mesmo que que o PIB, tal como medido convencionalmente, cresça lentamente, a tal da “economia verde” engendrará rápidas melhoras nos padrões de vida, desde que medidos nas múltiplas dimensões do bem-estar.

Para acessar o artigo no site do Valor Econômico, CLIQUE AQUI.